CONTRACARTOGRAFIAS: tecnopolíticas de espacialização da informação – atores, agenciamentos e sistemas
SPERLING, D. M; RAMOS, G. T.; SANTANA, C. M. CONTRACARTOGRAFIAS: tecnopolíticas de espacialização da informação - atores, agenciamentos e sistemas. Artigo apresentado no II Seminário Internacional Urbanismo Biopolítico: Urbanismo Neoliberal e Resistências Biopotentes. Belo Horizonte, 24 a 27 de Julho de 2018. Publicado originalmente em: RENA, Natacha; FREITAS, Daniel; SÁ, Ana Isabel; BRANDÃO, Marcela; (orgs.). Anais do II Seminário Internacional Urbanismo Biopolítico. Belo Horizonte: Associação Imagem Comunitária, 2019. Disponível em: https://wiki.indisciplinar.com/webdav/seminarios/06-05_FN1_ANAIS%20UB_2019_FN-5.pdf. Acesso em 17 de março de 2023.
David M. Sperling
Gabriel T. Ramos
Mariane C. Santana
Resumo: As articulações entre tecnologia, estética e política presentes na produção de cartografias podem extrapolar limites do que se compreende como representação e tornar visíveis importantes relações de poder presentes em um determinado território. Dentro da diversa gama de manifestações cartográficas, nos chamam atenção as que disputam criticamente a produção de narrativas, as “contracartografias”. Embora cartografias sejam historicamente conhecidas enquanto estratégias de se visibilizar um território, a aparição das contracartografias, por sua vez, tem contribuído para intervenções estético-políticas, sendo caracterizadas, principalmente, por colocar em disputa estratégias de poder e os próprios sujeitos participantes dessa produção cartográfica. São discutidos trabalhos de dois grupos que produzem contracartografias, Bureau D’Etudes (França) e Iconoclasistas (Argentina), tendo como objetos específicos o Atlas of Agenda (2015) e o Manual de Mapeo (2013), respectivamente. Em seguida, são apresentados resultados preliminares do projeto “SP S. A. Negócios e Participações Imobiliárias, um sistema em tempo real” em realização pelo Núcleo de Estudos das Espacialidades Contemporâneas (NEC.USP). São discutidas, por fim, as inventividades tecnopolíticas dessas manifestações contracartográficas, observando os diferentes objetos e escalas com que operam, bem como as visibilidades que pretendem, desde os poderes transnacionais e supraestruturais às articulações fenomênicas e locais, duas escalas que estão inextricavelmente conectadas com a produção do urbano no contexto contemporâneo.
Palavras-chave: Contracartografias; Tecnopolítica; Visibilidade; Relações de poder; Produção do espaço urbano.
Mapas, cartografias, mapeamentos...
Podemos narrar histórias das cidades ocidentais relacionando-as à fabricação de mapas desde que os localizemos em seus devidos contextos históricos, políticos, sociais e geográficos, e a diferentes necessidades, interesses, intenções e vontades daqueles que os produzem em determinadas circunstâncias. Porém, acreditamos que há um modo de fazer mapas que pode enriquecer essas relações e contextos. A complexidade das cidades pode ser estudada a partir de um tipo de cartografia, que, diferente de uma mera representação, trata-se de uma forma de relacionar pensamentos que possibilita tornar visíveis experiências coletivas nas cidades e nos auxilia a compreender campos de disputa: as “contracartografias”.
Em sua maioria, as cartografias se apresentam enquanto peças gráficas contendo informações e dados sobre fatos, acontecimentos e relações espaciotemporais. Dessa forma, podemos afirmar que o mapa faz parte do campo disciplinar da cartografia, apresentando-se como “ramo científico que se organiza pari passu com o desenvolvimento das relações capitalistas” (Girardi e Soares, 2015, p.47), ao qual podemos nos referir, sumariamente, como “mapa-objeto” e “cartografia-ciência”.
Além disso, é importante demarcarmos que as palavras “mapa” e “cartografia”, em muitos casos, vêm tendo seus usos empregados para designar o mesmo processo, mas abordam noções distintas. Embora seja agenciada simultaneamente no campo dos estudos cartográficos, a cartografia diz respeito à tessitura, ao modo de fazer ou à tarefa de relacionar acontecimentos, informações, dados, fatos e processos, geralmente, dispostos em uma forma gráfica específica que é o mapa. Sucintamente, podemos definir que a cartografia se conformaria como uma contextura e o mapa como um produto por ela tecido. Como uma espécie de linha de fuga, há ainda um terceiro termo que aparece nessa relação: o “mapeamento”, que não se constitui como técnica do campo da cartografia ou da geografia, tampouco se relaciona a uma forma específica de cartografar. O mapeamento pode ser compreendido “como processo [que] apresenta potência para exercitar a cartografia-analítica no entendimento das práticas humanas de produção de mapas-objetos como imagens que produzem pensamentos sobre espacialidades.” (Girardi e Soares, 2015, p.48).
A partir de Foucault (1984) e Agamben (2005), Girardi e Soares (2015) propõem que se considerem os mapeamentos como dispositivos: estão inscritos em jogos de poder (e saber); articulam discursos, instituições, enunciados e proposições; modulam distintas relações entre os elementos em jogo; possuem uma função estratégica dominante. O dispositivo - e assumindo-se o mapeamento como dispositivo - teria “a capacidade de capturar, orientar, determinar, interceptar, modelar, controlar e assegurar os gestos, as condutas, as opiniões e os discursos dos seres viventes” (Agamben, 2005, p. 13).
Na América do Sul, o termo “mapeamento” surge por meio de uma série de acontecimentos no campo cartográfico, incorporando a perspectiva de sua atuação como dispositivo de luta política pela ocupação do território. Numa espécie de “virada territorial” advinda dos anos 1980 (Acselrad, 2015), com o uso de ferramentas cartográficas, processos de mapeamento são utilizados nas demarcações e titulações de terras indígenas na América do Sul, estabelecendo-se como “base legal para os direitos culturais, a autodeterminação e o reconhecimento das terras tradicionais” (Offen, 2009, p.165).
Nesse contexto, notamos uma série de estudos cartográficos que se propunham ser coletivos e participativos, com relevância emancipatória significativa, a partir de objetivos específicos desses povos, encampando novas estratégias para pleitear o campo da cartografia e com problemáticas cruciais a serem consideradas com esse aprendizado. A cartografia, nesse contexto, pode produzir consequências não intencionadas, pois os mapas “podem ser constitutivos de, e ao mesmo tempo, constituídos por, relações sociais que conectam pessoas a lugares, identidades a territórios e, por essa razão, têm o potencial de criar novas, e com frequência, perturbadoras relações de poder” (Acselrad, 2015, p.12).
Em contrapartida, para Harley (1995), crítico da utilização da ferramenta cartográfica participativa, seria complexo para os indígenas apreenderem tal técnica, pois eles jamais conseguiriam imprimi-la adequadamente, devido à distância simbólica que existiria entre suas vidas e as realidades produzidas pelo aparato tecnológico do mapa. Por outra ótica, Andrews (1994 apud Acselrad, 2015) criticou a utilização da ferramenta, arriscando que essa técnica aplicada serviria de instrumento para os grupos majoritários, a seu modo, pacificarem o debate. Isto se deve ao fato de que, ao serem expostos em mapas diferentes aspectos das vidas desses sujeitos, essa cartografia tomaria uma forma de “autocrítica” (Acselrad, 2015), permitindo uma minimização dos problemas e uma maximização de dados e informações presentes no mapa.
Um outro ponto a ser considerado decorre do viés político em torno da utilização dos mapas pelos indígenas, pois para eles não há uma diferenciação na forma de representação do mundo ou pelo que se apresenta em termos de realidade. Dito de outra maneira, para eles, “o mapa é o território” (Acselrad, 2015), ou seja, a própria representação é a realidade. Logo, há um processo de retomada do território a partir do próprio mapa.
Ao articularem pessoas e lugares, identidades e territórios (Acselrad), pressuporem processos de (des)codificação (Harley), e (dis)tensionarem dados e demandas (Andrews), os mapas operam como dispositivos de disputa pelas próprias relações de poder; podem - arriscadamente - contribuir para as sobre-determinações ou, a partir de uma visada política comprometida com os dissensos, contribuir para processos de emancipação.
...contracartografias
Autores relevantes já sinalizaram a importância de uma inflexão na produção de mapas (Harley, 1989; Dodge, 2009; Crampton, 2010; dentre outros). Retomamos esta necessidade de inflexão acionando o pensamento de Jacques Rancière (1996), pelo qual os processos de mapeamento (as cartografias agenciadas e os mapas produzidos) devem ser enfocados, em um campo que articula o estético e o político, a partir da noção de dissenso. Ao compreendê-los como narrativas de espacialização, podemos operar pelo dissenso como o “desentendimento entre mesmas falas com sentidos parcial ou completamente distintos” (Sperling, 2016, p.86), falas compreensíveis como regime discursivo, entretanto, diferentes sobre o que se visibiliza ou do que se narra. São esses modos de fazer alternativos ao que se propôs como mapeamento durante boa parte da historiografia ocidental que passam a enfrentar e colocar o mapa não mais como representação, mas, sobretudo, como produção de realidades.
As formas de fazer mapa vêm sendo pensadas como ações horizontalizadas e cooperativasque envolvem a espacialização da informação acerca de contextos de vida nos quais os próprios agentes se veem implicados como sujeitos, instaurando campos de dissenso em relação aos mapas hegemônicos, que os assumem como objetos ou ainda agentes assujeitados. É na conjunção in situ entre coletivos que enfrentam situações de liminaridade e coletivos interdisciplinares (compostos por artistas, geógrafos, arquitetos, sociólogos, cientistas da informação, designers, antropólogos…) que conhecimentos informais e cotidianos e conhecimentos formais são (re)articulados. Muitos desses processos apontam outras operações possíveis e tensionam a forma positivista da cartografia como produção de representaçõesprecisas e, portanto, unívocas. Mais além, repensar e repropor mapas remonta à cartografia como um campo ampliado que coloca em articulação aspectos técnicos, proposições estéticas e posicionamentos políticos (Sperling, 2016).
Portanto, uma reviravolta nas cartografias provoca necessariamente importantes rebatimentos em diferentes campos disciplinares. Ao serem reconfigurados os modos de se pensar e fazer mapas, um campo relevante e de significativa potência no contexto contemporâneo passa a se configurar, o qual referenciamos como “contracartografia”, a partir de Brian Holmes (2006). Holmes conecta o termo que utiliza (counter cartographies) com o conceito foulcaultiano de “contraconduta”: como “recusas deliberadamente desnormalizadas da razão do Estado, elaboradas com as próprias ferramentas que consolidam a sociedade de controle.” (Holmes, 2006). Retomando diretamente Foucault, contracondutas
[...] são movimentos que têm como objetivo outra conduta, isto é: querem ser conduzidos de outro modo, por outros condutores e por outros pastores, para outros objetivos e para outras formas de salvação, por meio de outros procedimentos e outros métodos. São movimentos que também procuram, eventualmente em todo o caso, escapar da conduta dos outros, que procuram definir para cada um a maneira de se conduzir. (Foucault, 2008, p. 256- 257)
Compreender as contracartografias como articulações entre técnica, estética e política no sentido da produção de regimes de visibilidade dissidentes, permite considerá-las como formas tecnopolíticas de espacialização da informação. Para isso, é importante compreendermos que “estratégia” e “tática” são duas palavras provenientes das artes da guerra, intrinsecamente, associadas às formas de fazer mapa. Com Certeau (2013), podemos inferir que estratégia se trata de um saber que regula, gere e disciplina, tendo como objetivo a manutenção das estruturas que articulam o poder. As táticas, por sua vez, seriam o que o autor considera como práticas, ou seja, linhas de escape das membranas governamentais, mas que atuam por dentro da estratégia, nas suas possibilidade de decodificação no cotidiano.
De posse disso, podemos nos aproximar do conceito de tecnopolítica, situado por Toret (2015) que se articula, no contexto contemporâneo, como: 1) uso tático e estratégico das ferramentas digitais para a organização, a comunicação e a ação coletiva; 2) capacidade de automodulação de ações conjuntas, de cérebros, corpos e multidões conectados; 3) utilização da rede para inventar formas de agir, sem se esgotar ao universo digital.
A dupla condição de centralidade das redes digitais e o não esgotamento das ações políticas a elas, nos sugere uma aproximação mais precisa com o pensamento de que as tecnopolíticas “são híbridos de sistemas técnicos e práticas políticas que produzem novas formas de poder e agenciamento” e que “as tecnologias não são si mesmas tecnopolíticas. Antes, a prática de uso delas em processos políticos e/ou com objetivos políticos constitui a tecnopolítica.” (Edwards e Hecht, 2010, p.256-7 apud Kurban, Peña-Lopez, Haberer, 2016, p.502).
Estratégias contracartográficas e relações de poder
Em artigo anterior, destacamos três “linhas cartográficas” que vêm sendo sistematizadas em nossa pesquisa em andamento, com proximidades por meio de um comum, mas diferenças em especificidades: trajetórianarrativa, arquivo visual e gráfico-diagrama (Sperling, 2016). Para o recorte desta comunicação, refletiremos acerca dos “gráficos-diagramas” que se constituem como:
[...] cartografias que desenham similitudes com o visível por meio de linhas abstratas ou contornos semelhantes; selecionam campos de atuação e desenham projeções de configurações de totalidades (sempre) parciais, em movimento, em processo de (des)articulação. Como postura, o cartógrafo-agenciador assume o mundo composto por conexões no espaço e no tempo entre agentes e poderes, estados e potências, presentes e devires (Sperling, 2016, p.88).
Como “ativismos cartográficos” (Santos, 2011) - ativismos sociais e políticos ou manifestações artísticas - as práticas contracartográficas na forma de gráficos-diagramas vêm se consolidando como tecnopolíticas de explicitação de relações de poder, articulando atores, agenciamentos e sistemas. São experimentações que atualizam a necessidade indicada por Jameson (1991) - e retomada por Holmes (2006) - da pesquisa em direção à “estética do mapeamento cognitivo”, buscando-se delinear totalidades provisórias das intrincadas e fugidias dinâmicas do complexo econômico-cultural-espacial contemporâneo.
Em se tratando do campo da arquitetura e urbanismo, o contexto de onde parte nossa pesquisa, a incorporação de práticas contracartográficas inter e indisciplinares, focadas em processos espaciais e sociais mostra-se de extrema relevância para a compreensão da produção dos territórios urbanos por ativos intangíveis geridos cada vez mais pelas lógicas da financeirização globalizada, seus atores correlatos e efeitos colaterais.
Um atlas de agendas: contracartografias de sistemas mundiais
“Atlas of Agendas” (2015) é um livro-atlas que compila mapas e textos produzidos ao longo de mais de uma década pelo coletivo de design e pesquisa francês Bureau d’Études, fundado por Léonore Bonaccini e Xavier Fourt, em 1988 (Figura 1). Disponíveis anteriormente para consulta e impressão em grande formato, e orientadas a desvendar sistemas políticos, sociais, econômicos do contexto atual, “estas visualizações de interesses e relações re-articulam a ordem simbólica e atualizam estruturas existentes que de outra maneira permaneceriam escondidas e desconhecidas” (Bureau d’Études, s/d). Dentre os temas abordados pelo grupo encontram-se: política e petróleo; biopolítica e agronegócio; sistema financeiro mundial e produção de crises; complexos industriais da fármacos, de mídia e financeiros.
Dois de seus mapas mais conhecidos, Wartime Chronicles 1 e 2, ou Crônicas de Tempos de Guerra, produzidos sintomaticamente em 2001, são desenhados como gigantescos organogramas que mimetizam códigos visuais empresariais e militares para articular relações de hierarquia, dependência e retroalimentação entre agentes de um sistema, e indicações de porcentagens em participações societárias entre parceiros.
O primeiro, que delineia um polo tecnológico e militar, apresenta relações entre empresas de armamento e telecomunicações, serviços secretos, Estados, think tanks, forças policiais que atuam em rede, facções, redes de cabos, satélite e universidades. O segundo (Figura 2), que apresenta o pólo de controle de fluxos financeiros globais, expõe conexões entre bancos, fundos de pensão públicos e privados, empresas transnacionais, corpos de liderança, companhias de investimento, lobbies, redes de máfia, zonas offshore
Figura 1: An Atlas of Agendas. Fonte: Bureau d’Études, 2015. Disponível em: . Acesso em jun. 2018.
e organizações públicas internacionais. Ao serem lidos conjuntamente, os mapas permitem o reconhecimento de atores que operam em cadeias intrincadas tanto de controle financeiro, quanto tecnológico e militar.
Figura 2: Wartime Chronicles 2. Fonte: Bureau d’Études, 2001. Disponível em: http://utangente.free.fr/anewpages/war2.html. Acesso em mar. 2023.
Sabendo que a produção dos territórios urbanos não é o foco destes mapas, não é possível deixar de inferir que os agentes deste sistema e suas ramificações operam igualmente na formulação de manuais de boas práticas para políticas públicas e oferecimento de créditos financeiros para países em desenvolvimento (como o Banco Mundial), e no investimento em fundos imobiliários que atuam em grandes centros urbanos (como o Soros Fund Management LLC).
Um manual de “mapeo”: contracartografias de agenciamentos locais
“Manual de Mapeo Colectivo” (2013) é um livro sistematiza estratégias de mapeamento e cartografias críticas realizadas pelo duo argentino Iconoclasistas, fundado em 2006 por Pablo Ares e Julia Risler (Figura 3). Por meio de oficinas, a dupla se aproxima de determinado contexto convertendo-se em facilitadores; ativando questionamentos em torno do território em que vivem os participantes, no sentido de circunscrever um tema agudo que envolve agentes locais, processos de dominação e formas de resistência. Mapas provisórios são produzidos em aproximações sucessivas até que uma estrutura visual se configure, em “um processo de criação que subverte o lugar de enunciação para desafiar os relatos dominantes sobre os territórios, a partir dos saberes e experiências cotidianas dos participantes” (Risler e Ares, 2013, p.12). Mais que os mapas resultantes, o coletivo assume como seu foco a pedagogia e a experiência disseminada de realização de cartografias visuais contra-hegemônicas.
Figura 3: Manual de mapeo colectivo. Fonte: Iconoclasistas, 2013. Disponível em: <http://www.iconoclasistas.net/mapeo-colectivo/>. Acesso em mar. 2023.
Dentre os temas enfrentados pelo coletivo tem-se: condições de trabalho e vida cotidiana, impactos sociais e ambientais de conglomerados de agronegócio e mineração, especulação imobiliária e gentrificação, narrativas de movimentos sociais e resistências políticas.
Um caso representativo de seu trabalho é a cartografia crítica La República de los Cirujas, ou A república dos Catadores, realizado em 2013 a partir de convite da Universidad San Martin, para sistematizar um processo de cooperação entre a universidade, catadores/recicladores de lixo e cidadãos de bairros periféricos da cidade de Buenos Aires, próximos ao maior aterro sanitário da cidade (Complejo Ambiental Norte III CEAMSE - Coordinación Ecológica Área Metropolitana Sociedad del Estado). O trabalho, em formato de publicação e mapa, visibiliza a situação da região a partir de uma economia dos rejeitos (migrantes, imigrantes, lixo e contaminantes), das condições extremamente precárias de vida (crise habitacional, água contaminada, falta de esgoto, violência) e de trabalho (desemprego e subemprego como catadores há várias gerações), e a ausência do Estado (inexistência de serviços públicos) (Figura 4).
Figura 4: La República de los Cirujas. Fonte: Iconoclasistas, 2013. Disponível em: <http://www.iconoclasistas.net>. Acesso em mar. 2023.
SP S. A.: entre agenciamentos locais e sistemas mundiais
Através de investigação teórica e experimentação prática, por meio de articulações entre universidade e sociedade, o Núcleo de Estudos de Espacialidades Contemporâneas (NEC.USP) vem produzindo contracartografias e processos de mapeamento focados em processos de conformação de espacialidades a partir de suas inter-relações com aspectos econômicos, culturais, tecnológicos e políticos contemporâneos. Trabalhos anteriores se debruçaram sobre condomínios fechados (Zonas Liminares, 2010-11), espaços urbanos e camadas de informação (Cartografias = espaço + informação, 2012-2013), aeroporto como dispositivo e logísticas de trabalho análogo ao escravo (GRU-111, 2016-17).
Em trabalho iniciado em 2018, o núcleo vem desenvolvendo a pesquisa “SP S. A. Negócios e Participações Imobiliárias, um sistema em tempo real”, acerca da ocupação do território da cidade de São Paulo por empresas ligadas a práticas de offshore, pelas quais o principal beneficiário é mantido sob sigilo e cujas jurisdições, em geral, localizam-se em paraísos fiscais. Embora tal atividade não seja considerada ilegal no Brasil, sua prática está fortemente atrelada a situações que envolvem corrupção e lavagem de dinheiro. Junto a isso, é significativo pensar na influência dessas práticas sobre o território da cidade, utilizando-se da compra de imóveis que, por vezes, aglutinam-se em determinadas regiões, influindo na conformação urbana.
O estudo tem como ponto de partida um dos relatórios disponibilizados pela organização Transparência Internacional, intitulado “São Paulo: a corrupção mora ao lado” e publicado em fevereiro de 2017 - levando-se em consideração a especificidade e as conexões desta organização, fato a ser tratado adiante. Assumimos o documento como uma fonte de dados sobre como se apresentava o setor de empresas offshore na cidade de São Paulo até a data de sua publicação, revelando um quadro que se reflete na ocupação do território urbano no qual “mais de 3.450 imóveis pertencem a 236 empresas que são ou foram ligadas a arranjos corporativos baseados em jurisdições pouco transparentes, entre elas as Ilhas Virgens Britânicas, o estado norte-americano de Delaware e o Uruguai.” (Angélico, 2017, p.6).
Uma das conclusões apresentadas pelo relatório é a concentração dos imóveis pertencentes a empresas offshore em regiões mais nobres da cidade de São Paulo, como o eixo entre as Avenidas Chucri Zaidan e Engenheiro Luiz Carlos Berrini, a Avenida Paulista e o bairro Vila Nova Conceição (Figura 5).
Figura 5: São Paulo: a corrupção mora ao lado? Fonte: Relatório Transparência Internacional (2017). Disponível em: <www.transparency.org/whatwedo/publication/sao_paulo_a_corrupcao_ mora_ao_lado.> Acesso em mar. 2023.
Apesar de conter informações acerca dessas práticas na cidade de São Paulo, o relatório não se desdobra sobre o agenciamento e a espacialização dessas informações, métodos que seriam próprios da atividade contracartográfica. Contendo dois anexos nos quais são tabeladas as 236 empresas e os 3452 imóveis identificados, o relatório apresenta dados como o endereço da sede da empresa, a sua jurisdição de offshore e os endereços dos imóveis pertencentes a estas empresas, assim como suas tipologias, área e valor venal.
Diante de tal profusão de informações, que se apresentam em números exorbitantes, que permanecem desconexas, iniciamos experimentações com referência à “estética do mapeamento cognitivo”, no sentido de “dotar o sujeito de algum novo senso ampliado de seu lugar no sistema global” (Jameson, 1991, p.54, tradução nossa). O projeto orienta-se pela elaboração de outras aproximações que busquem situar os dados disponibilizados em estruturas cognoscíveis e críticas, próprias das contracartografias
[...] como modos de correlação e espacialização da informação que, por meio de re-elaborações estéticas e aproximações daquilo que usualmente se apresenta ou é oferecido de modo disperso à percepção, podem desvelar aspectos da realidade contemporânea, ativando a compreensão e a tomada de posições críticas. (Sperling; Santos, 2017, p. 19)
A primeira contracartografia (Figura 6) enfoca o que chamamos de “territorialidades empresariais”, localizando e dimensionando a atuação das empresas offshore na compra de imóveis da cidade de São Paulo, segundo os dados do relatório utilizado. Produzida por meio de software de geração de gráficos georreferenciados (Excel), esta contracartografia revela eixos de concentração dessa prática no território, assim como empresas hegemônicas, ao conectar endereço (posição no mapa), quantidade de imóveis por proprietário (dimensão dos círculos) e proprietário (cor do círculo). Na legenda, foram destacadas as 15 maiores empresas ligadas à prática de offshore proprietárias de imóveis na cidade. Como resultado, tem-se um vetor Sudoeste-Noroeste de maior concentração de imóveis ao redor do qual há uma dispersão gradual, em uma imagem que remete a um enxameamento sobre o território.
Figura 6: SP S. A. Negócios e Participações Imobiliárias, um sistema em tempo real. Fonte: Autores, 2018.
A segunda contracartografia (Figura 7) foi produzida a partir de uma abordagem inter-escalar, adotando como território o bairro da Vila Nova Conceição, que foi destacado pelo relatório como um dos pontos de concentração dos imóveis registrados, contendo 34 propriedades que, somadas, representam um valor venal de mais de 21 milhões de reais. Diante desse dado, a elaboração dessa contracartografia atuou estabelecendo conexões entre as esferas local — o imóvel, o endereço que representa o ponto de interferência fenomenológica dessa prática na cidade de São Paulo — e global — a rota proveniente das superestruturas do capital traçada em direção a paraísos fiscais ao redor do mundo —, ambas entrelaçadas diante da figura das empresas offshore.
Figura 7: SP S. A. Negócios e Participações Imobiliárias, um sistema em tempo real. Fonte: Autores, 2018.
O projeto contracartográfico “SP S. A. Negócios e Participações Imobiliárias, um sistema em tempo real”utiliza como referência o trabalho de arte conceitual do artista alemão Hans Haacke, intitulado “Shapolsky et al. Manhattan Real Estate Holdings, a Real-Time System, as of May 1, 1971” (Figura 8). Nessa obra, Haacke expõe 142 imóveis de habitação de baixa renda no distrito de Manhattan, utilizando de diferentes formas representacionais, desde a fotografia do edifício até documentações referentes à propriedade do imóvel.
A partir desses distintos universos de informação, interligando tanto a característica tipológica dos prédios quanto os dados recolhidos em suas documentações, o artista esboça uma teia de relações entre as construções, de modo que, apesar de registradas “em nome de mais de 17 corporações distintas” (Solfa, 2010, p.21), revela-se que todas as propriedades são pertencentes à família nova-iorquina Shapolsky, diluída e invisibilizada em corporações “[...] que hipotecavam e vendiam constantemente os edifícios entre si como forma de diminuir os impostos e aumentar as taxas de lucro” (ibidem, p.21), controlando, inclusive, o preço dos aluguéis nesta região.
Figura 8: Shapolsky et al. Manhattan Real Estate Holdings, a Real-Time System, as of May 15, 1971 – Hans Haacke. Fonte: Gabrielsen, 2015. Disponível em: <http://www.kunstkritikk.no/artikler/ga-institusjonen-pa-nervene/>. Acesso em mar. 2023.
Em seu processo de levantamento imobiliário, Haacke também elabora mapeamentos que correlacionam o tecido urbano com a prática de controle imobiliário estabelecida pela família Shapolsky, indicando pontos de influência e manchas que se sobrepõem ou se aglutinam, bastante representativas enquanto zonas onde o poder de influência das corporações se dá de maneira mais intensa (Figura 9). Um mapa como esse, ao qual nos referenciamos para o Projeto SP S. A., é capaz de promover uma outra leitura do território urbano, concedendo pistas de processos de poder econômico que modelam e subjugam uma realidade urbana (Para um histórico de atuações de Shapolski Real State ver: https://www.shapolskyrealestate. org).
Figura 9: Shapolsky et al. Manhattan Real Estate Holdings, a Real-Time System, as of May 15, 1971 (excerto) – Hans Haacke. Fonte: Gabrielsen, 2015. Disponível em: <http://www.kunstkritikk.no/artikler/ga-institusjonen-pa-nervene/>. Acesso em mar. 2023.
Diferentemente do trabalho de Haacke, o projeto SP S. A. assenta-se até o momento em fontes secundárias (relatório produzido pela Organização Transparência Internacional) e formas mediadas de acesso à informação (interfaces de informação e imagens georreferenciadas como Bing Maps Google StreetView). Estão no horizonte do desenvolvimento deste trabalho algumas linha de ação: a ampliação do projeto piloto para as outras áreas; a incorporação de outras fontes de informação; a comparação das territorialidades empresariais com as territorialidades dos imóveis vazios e em disputa por movimentos de luta por moradia; a comparação de fluxos internacionais de capital de offshores e fluxos migratórios de pessoas em luta por moradia.
No que diz respeito ao papel da Transparência Internacional na realização de relatórios que expõem dados que articulam negócios imobiliários com processos de corrupção, interessa-nos incluir no projeto as redes que a conectam, dentre outros financiadores, à Open Society Foundation, conectada ao fundo de serviços financeiros Soros, e destacada
no Mapa Wartime Chronicles 2 de Bureau d’Études (Para a rede de financiadores da Transparency International ver: https://www.transparency. org/whoweare/accountability/who_supports_us/2.). Entre cifras bilionárias de seu patrimônio doadas para esta fundação, pairam sobre suas ações rumores de financiamento econômico e influência no cenário político de vários países ao redor do globo para a facilitação da criação de ambientes para negócios.
A ação de contracartografar exige, portanto, que se coloquem em relação, na medida do possível, todos os atores implicados, o seu papel nos agenciamentos e nos sistemas engendrados. Neste processo, não existem sujeitos e objetos, os cartógrafos também estão implicados.
Considerações finais
A partir de um conjunto de referências, compreendemos contracartografias à luz do conceito de “mapeamento crítico” (Crampton & Krygier, 2006), como uma prática pós-representacional focada não em representações verídicas de realidades pré-existentes, mas em delinear hipóteses, construindo conhecimento e disputando narrativas sobre processos e situações dinâmicas (Abrams & Hall, 2006). Em segundo lugar, contracartografias são conectadas com a noção de “mapeamento cognitivo” (Jameson, 1991) como um modo de mapear: i) posições individuais e coletivas; ii) informações espaciais e sociais; iii) articulando coordenadas existenciais com totalidades abstratas para o entendimento das realidades que construímos e nas quais vivemos. Em terceiro lugar, práticas contracartográficas se originam das artes, da geografia, filosofia, ciência da informação, estudos sociais e culturais, assim como da arquitetura e do design, ou - e ainda com mais interesse - de agenciamentos interdisciplinares de diferentes atores e comunidades que têm em comum um comprometimento em engajar: i) na articulação entre conhecimento formal e informal (Ashley, Kenton & Milligan, 2006); ii) na experimentação estética com vários tipos de mídia que podem ser utilizadas para conectar dados (D’Ignazio, 2009); iii) nos sentidos políticos do próprio ato de mapear criticamente (Crampton, 2010).
As contracartografias produzidas por Bureau d’Études e Iconoclasistas partem de origens distintas em direção a um território comum. Enquanto as primeiras pretendem desvendar articulações sistêmicas em escala global, diante das quais todos estão in situ, as últimas explicitam agenciamentos locais com a participação de comunidades em situação de liminaridade. Ambas expõem lógicas de produção de dominação e controle econômico e social, baseadas em articulações escusas entre atores e na expropriação da vida - às quais as produções dos espaços urbanos estão inextricavelmente vinculadas.
Nesta esteira se coloca o projeto contracartográfico “SP S. A. Negócios e Participações Imobiliárias, um sistema em tempo real”, apresentando ainda que em estágio preliminar aspectos da realidade urbana paulista, representada na posse e uso de imóveis que encontram-se diretamente atrelados a circuitos financeiros globais em práticas não-transparentes.
Correlacionar estas duas escalas: a conformação de ruas, bairros e regiões, com a espacialização de empresas que operam em redes de paraísos fiscais mundiais, assim como correlacionar tais práticas empresariais com outras vinculadas à produção de relatórios como o utilizado como fonte - é uma estratégia contracartográfica em busca de uma maior compreensão sobre a conformação dos territórios urbanos contemporâneos, induzindo, com tal visibilização, a realização de outras formas de pensar e produzir cidade, o desenvolvimento de contracondutas.
Referências Bibliográficas
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