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Cartografias da economia em deslocamento: um estudo de caso na Feira do João Francisco (Goiás-GO)

SPECIAN, R. D. RAMOS, G. T. Cartografias da economia em deslocamento: um estudo de caso na Feira do João Francisco (Goiás-GO). Trabalho de Iniciação Científica realizado por Renan Duarte Specian sob orientação do Prof. Dr. Gabriel T. Ramos, entre 2020 e 2021. Apresentado no XVIII Congresso de Pesquisa e Extensão da UFG (Conpeex UFG, 2021). Disponível em: https://programacaoconpeex2021.ufg.br/. Acesso em 21 de março de 2023.

Renan D. Specian

Gabriel T. Ramos
 

Resumo: Este trabalho tem como objetivo apresentar o desenvolvimento e os resultados do plano de trabalho: "Cartografias da economia em deslocamento: um estudo de caso na Feira do João Francisco (Goiás-GO)", a partir de experimentações metodológicas de narrativas cartográficas. O plano é vinculado à pesquisa "Cartografias dos territórios urbanos contemporâneos" (2019-2022). A metodologia utilizada se constituiu a partir de investigações e varreduras no Google Maps, no Google Street View, em experimentações de desenho e de fotografias e cartografias, além de inspirações no trabalho "The Manhattan Transcripts" (Bernard Tschumi, 1984). Os resultados são traduzidos em um atlas, apresentado em formato de pranchas anexas.

Palavras-chave: Narrativas cartográficas. Eventos. Deslocamentos. Feira do João Francisco. The Manhattan Transcripts.

 

Apresentação

Este plano de trabalho tem como objetivo investigar deslocamentos urbanos por meio de narrativas cartográficas, tendo como estudo de caso os realizados na feira do João Francisco, em Goiás-GO. Por um lado, observam-se novas formas de ocupação e deslocamentos urbanos, que se transformaram, ao longo das últimas décadas, por conta da “velocidade” (VIRILIO, 1991) imposta às nossas ações nos dias atuais, o que também implica em cidades menores, como o caso da cidade de Goiás. Por outro, no entanto, é perceptível os impactos causados pela velocidade dentro do ambiente urbano e de espaços de circulação, bem como o parco acesso de práticas cotidianas "lentas" (SANTOS, 2001), especialmente, quando é observada a interrupção dessas formas de ocupação, por conta de isolamento social. 

Surgida na metade dos anos 1980, a Feira do João Francisco é uma dessas práticas, realizada no mesmo local até os dias atuais, na Avenida Dário de Paiva Sampaio. A feira tem como enfoque produtos trazidos pelos pequenos agricultores da região como tempeiros, grãos, ervas medicinais e hortifrutigranjeiros, o que a tornou um ponto de confluência de vários sujeitos a residirem próximo ao local onde ocorre (CORRÊA; LIMA, 2015). A região da feira é considerada por muitos da cidade como seu centro, devido aos equipamentos de serviço, comércio e infraestrutura nela presentes, em contraste com o centro histórico, por sua vez, de caráter turístico, com equipamentos, monumentos e prédios históricos, além de muitos edifícios vazios, contendo poucos espaços de habitação.

 

Nesse sentido, este estudo visa compreender, de maneira inventiva, eventos urbanos (TSCHUMI, 1984), movidos pelas relações socioespaciais existentes entre os agentes modeladores da cidade e as espacialidades, uma vez que os impactos do uso, da ocupação e da apropriação quase sempre passam despercebidos. Tem-se diversos exemplos de espaços e de espacialidades que os deslocamentos e fluxos criam, como uma loja que abre em certo lugar, a partir da passagem de pessoas; a instalação de infraestrutura elétrica para postes de luz que antes não existiam, colocados para atender a uma demanda; e, até mesmo, o aparecimento de caminhos entre gramados, onde antes não existiam, após trânsitos constantes de pessoas neles.

 

Um dos fatores que colaboram para a não percepção dessas alterações na produção de espacialidades pelos deslocamentos urbanos é a “velocidade”, amalgamada, por sua vez, nos sujeitos que constantemente modificam o espaço. Nesse sentido, para este recorte de estudo, o interesse maior é compreender os espaços-entre e as possíveis relações afetivas que neles ocorrem, para além de ligação entre um ponto a outro, visto que esse espaço de transição perde sua significância e passa a ser apenas uma linha de conexão. Dessa forma, todos os deslocamentos que ocorrem são menos notáveis, sendo de interesse, portanto, desta pesquisa ressaltar as espacialidades evidenciadas a partir do tensionamento da “velocidade".

 

Tendo em vista que há a emergência da compreensão dos deslocamentos e dos eventos urbanos, sendo discussões ainda pouco exploradas na arquitetura e urbanismo, propõe-se entender como acontecem os fluxos dessas práticas na cidade a partir de um olhar imaginativo, que já extrapolam os trabalhadores e moradores da cidade, e alcançam outras práticas e sujeitos. Para isso, buscou-se realizar cartografias desses deslocamentos, a partir da combinação entre imagens, textos, mapas e desenhos, a fim de imaginar possibilidades de utilização e apropriação dos espaços na Feira do João Francisco. 

É Importante ressaltar que a pesquisa adquire novas intenções após o acontecimento da pandemia, com importantes consequências: a impossibilidade de pesquisa em campo e de exploração das vivências locais levam os autores a buscar novos métodos de pesquisa e de reflexão sobre o mesmo objeto de estudo. A pesquisa assume um caráter mais imagético e propositivo além de produzir uma reflexão sobre o que essa falta de informação digital ocasiona para o espaço. Para isso, são estudadas e desenvolvidas novas referências bibliográficas que se adequam mais à intenção de projeto, sendo dentre essas, a principal:  "The Manhattan Transcripts" (TSCHUMI, 1984), obra do  arquiteto e escritor Bernard Tschumi. Também é importante citar as reflexões de Marilia Solfa (2008) e de  Gabriel Ramos (2021), que discutem estudos de espacialidades e representações, tendo como balizadoras as obras e o posicionamento teórico-projetual de Tschumi.

 

Metodologia

Para fundamentação e compreensão da temática a ser abordada, bem como do desenvolvimento de meios propositivos para a iniciação científica, a metodologia desta pesquisa foi dividida em três aspectos: Teóricos, Empíricos e Metodológicos. Nos aspectos teóricos, visou-se estudar, primeiramente, obras textuais gerais que explicitaram a necessidade de se fazer pesquisa em arquitetura e urbanismo, bem como aquelas que buscaram pensar a ideia de projeto para além do "real", mas, sobretudo, para suas possibilidades.

Uma das obras estudadas neste sentido foi "Homo Tegumen" (MARGOTTO; ALMEIDA, 2017), que apresenta um narrador observador onipresente que narra a história de uma nova forma de habitar os espaços. A história se passa num futuro em que ocorre uma mutação genética da pele humana, que se expande e passa a ser não só uma proteção do corpo, mas se transforma em uma massa gelatinosa que envolve os seres humanos, dessa forma, os conceitos do que são corpo e espaço habitado se tornam difusos, gerando novas discussões sobre a vida em sociedade. Os autores se preocupam em modificar não a estrutura física do entorno habitável e sociável em si, mas, ludicamente, mostrando essa intenção de debate através da modificação da estrutura biológica do ser humano, transformando-o no “Homo Tegumen" (Figura 1). O texto apresenta reflexões sobre a cidade e incita dúvidas sobre qual o futuro a ser seguido, sugerido que a arquitetura não seja somente espaço físico, mas lúdica e inventiva, deixando pistas da importância das relações sociais, das apropriações, das interações entre as pessoas, das sensações e dos eventos e acontecimentos nos espaços.

Além dessa, a intervenção projetual Party Lights, no Centro de Brasília, de Ana Clara Daher, também serviu como inspiração para a reflexão (Figura 2). O trabalho é apresentado como história em quadrinhos, que funciona como representação e produto, no que diz respeito à utilização de imagens e modelos representando a intenção da intervenção no espaço escolhido. Neste trabalho, há a intenção de valorizar o ponto central de confluência das vias de Brasília, onde se encontra a rodoviária da cidade. Primeiramente, a autora faz uma referência histórica do projeto de Brasília e das intenções de Lúcio Costa no seu urbanismo moderno, expondo que o urbanista já pensava na centralidade da rodoviária e na sua importância para Brasília. Foi interessante observar que a intervenção não parte apenas de uma intenção própria, sendo fundamentada tanto no aspecto da cidade atual, quanto também em sua disposição original. O espaço físico é constituído, porém, as relações urbanas e a ocupação não ocorrem como previsto no projeto, assim, a rodoviária, mesmo sendo o ponto central físico da cidade, perde o posto de centralidade emocional para a população.

A intervenção ocorreria através da utilização da luz para retornar o interesse e imponência para o local (daí o nome do trabalho “Party Lights”, ou "luzes festivas"), por meio de um conjunto de intervenções em vários pontos da rodoviária, como o Buraco do Tatu. Para cada espaço analisado, o trabalho o considerou através da luz, que possui diferentes formas de implementação, a depender da necessidade. Em alguns locais, seriam utilizados painéis de led criando paredes holográficas, em outros, fitas de led criando fluxo e movimento em algum sentido desejado. Além disso, a instalação de canhão de luzes no topo do edifício conectaria o espaço central e criaria curiosidade, reforçando a conhecida monumentalidade para o local em Brasília.

Por fim, a título de leituras conceituais mais centralizadas, estudamos as antagônicas epistemologias da "velocidade", a partir de Milton Santos (1994; 2001), com sua visão acerca de outras velocidades possíveis (como a lentidão daqueles que não acessam a esses esquemas); e a partir de Paul Virilio (1996), que relaciona a velocidade à guerra e à estratégia, realizando uma discussão da vulgarização do tempo nas narrativas estratégicas dos grandes poderes; bem como de obras que apoiem a compreensão sobre Goiás e outras dimensões de leitura do território e do cotidiano, como a de Michel de Certeau (2013) sobre táticas e estratégias e sobre as práticas de cidade a partir do ordinário.

Os aspectos empíricos foram experimentações de leituras de campo na cidade de Goiás mediadas por sistemas cartográficos provenientes da Google. Especificamente, sobre a compreensão do funcionamento da feira e dos fluxos nela presentes, isso se desdobrou a partir de investigações cartográficas expandidas, que utilizam de outros mecanismos de linguagem (SPERLING, 2017) e por uma atenção no ato de cartografar (RAMOS, 2021).

Já os aspectos metodológicos se trataram da produção de um "atlas" que reinventa histórias na Feira do João Francisco, dividido em quatro tópicos norteadores: “O que era”, “O que o mapa mostra”, “O que é” e “O que pode ser”. Assim, devido à pandemia de Covid-19 e à necessidade de isolamento social, buscaram-se novas formas de estudar, analisar e compreender o espaço da Feira do João Francisco à distância. Para isso, a metodologia utilizada na sua produção se constitui a partir de investigações e varreduras no Google Maps, no Google Street View, em experimentações de desenhos, fotografias e cartografias e como referência compositiva, reflexiva e estética, o trabalho "The Manhattan Transcripts" (TSCHUMI, 1984), à luz de reflexões e abordagens trazidas em Solfa (2010) e Ramos (2021). Dessa forma, foi possível realizar uma reflexão crítica acerca de sistemas cartográficos digitais e uma composição imagética “virtual” do que poderia ser a Feira do João Francisco.

Resultados e discussão

Os resultados foram encontrados de formas não completamente esperadas no início desta pesquisa, uma vez que nossa metodologia de trabalho foi alterada no decorrer dela. Em seu início, imaginávamos a produção de uma análise teórica e “imediata” do espaço, ou seja, do que vemos e presenciamos ao utilizarmos a feira, o que foi modificado para algo "mediado" do espaço, a partir de sistemas cartográficos e mecanismos de representação técnica, gráfica e visual. 

Com o surgimento da pandemia de Covid-19 e o consequente isolamento social, buscaram-se novas formas de pensar e estudar o espaço. A partir desse cenário, passamos a analisar a feira não em seu caráter "atual", mas "virtual", enquanto "possibilidade de ser". Esse conceito é trabalhado por Gilles Deleuze (2003), e se constitui na ideia de que o real se divide em dois aspectos: ele contém seu caráter atual, que é o qual vivemos, presenciamos e analisamos, e, também, o virtual, que se constitui na possibilidade de existir a partir do real, algo que não necessariamente existe, mas que poderia se tornar atual. Assim, por meio da observação da Feira do João Francisco, tais conceitos implicaram na observação de seu momento de realização, aos domingos, pela manhã, em que ela se atualiza; quando é desmontada, ela se virtualiza, pois ela não estaria mais ali, mas na possibilidade ocorrer no domingo seguinte, pela manhã.

Assim, iniciou-se uma nova fase do trabalho, em que o espaço da feira adquiriu diversas atribuições, em que passamos a olhar não somente para o acontecimento da feira, mas, também, para o não-acontecimento da feira: o vazio e as temporalidades que a demarcam como evento periódico em um espaço físico. Dessa forma, percebemos que o vazio é tão importante quanto seu contrário. Este pensamento é referenciado no estudo de Bernard Tschumi através do seu trabalho “The Manhattan Transcripts” (1984), em que o autor também analisa e percebe a mesma importância do espaço vazio, mutável e transitório. Em sua tese de doutorado, Marilia Solfa (2010) afirma sobre a forma de Tschumi conceber a “arquitetura do evento”.

Em sua teorização da “arquitetura do evento”, o arquiteto deixa clara sua vontade utópica de transformar o lugar comum, de questionar a pertinência do espaço existente e de repensar o que estava convencionado e pré-estabelecido. Visava construir espaços que pudessem se colocar às margens da lógica que então regia o espaço urbano, “deprogramando-o”. Locais desprogramados seriam locais de imprevisão, de não-controle e, por isso, locais de onde seria possível emergir algo novo e até então inconcebido. Assim, ele almejava criar meios “arquitetônicos” que viabilizassem a desestabilização das relações sociais opressivas e a resistência à organização da cidade que tendia a funcionalizar o espaço e torná-lo parcial e programado, delimitando-o lugar e função de cada indivíduo (SOLFA, 2010, p.33).

Essa referência nos trouxe para a ideia de uma “arquitetura de evento”, característica do espaço mutável e inconcebido. Entretanto, a partir dessa ideia, colocamo-nos a pensar no espaço vazio, contrário ao espaço do evento, ou seja: o que acontece com esse espaço quando o evento nele não acontece? Para responder essa pergunta, surge o vazio: mas o que ele seria? A palavra em questão assume diversas definições, como o “que não contém nada, (ou contém apenas ar) ou quase nada. [...] e em que não há ou há poucos ocupantes ou frequentadores.” Os dois podem ser usados para representar o espaço ausente de seu evento, entretanto, partimos para uma análise um do que pode acontecer nas ausências. 

Para este estudo, foram usadas imagens de satélite provenientes do Google Earth. Em nenhuma foto do sistema da Google (Earth, Street View, Imagens), é presente a Feira do João Francisco. Ela não aparece em nenhuma perspectiva, de modo que, para uma pessoa de fora da cidade que nunca esteve na feira pessoalmente, não há como saber que naquele espaço ocorre um encontro de diversas pessoas todo domingo pela manhã há várias décadas. Essa invisibilização é procedimento bastante comum para aqueles que estudam as cartografias da Google, demonstrando como nelas não há a possibilidade de aparecer tudo, mas sempre seus recortes.

Dentro do mapa da Google, (...) Os rostos das pessoas são como placas de carro: desfocados; o ângulo é sempre o mesmo, e todo lugar parece qualquer outro. A viatura da Google entra somente em locais supostamente mais seguros; e, dentre vários outros aspectos, o mais relevante é que o mapa é uma reprodução social. E dada a histórica fidedignidade confiada à forma- mapa, nada mais avassalador do que ela ser cada vez mais inquestionável, já que, mais recentemente, também, é a ela entremeada uma alta produção e consumo de fotografias em tempo real (RAMOS, 2021, p. 184).

 

Após observarmos as fotos, compreendemos um caráter muito mais subjetivo para a palavra “vazio”, principalmente para quem conhece a feira e nela já esteve presente. Mas, para além disso, a palavra agrega uma importância ainda maior: o vazio marca a não-permanência do evento. Ou seja, o evento só é temporário porque em um determinado momento ele não existe, ou não acontece, e essas temporalidades passam a ser determinantes para o conceito tanto da “arquitetura de evento” quanto para a ideia de espaço mutável, que assume diversas funções.

Ao final do estudo, atingimos um novo aspecto do espaço: o espaço imaginado. Ainda ligados a impossibilidade de estar presencialmente no local de estudo, pensamos em possíveis ideias para finalizar nosso estudo. A partir de uma metodologia que consiste em desenhar por sobre fotografias em que se projetam possibilidades, melhorias e novas perspectivas do espaço, pensamos na mesma maneira de apresentar o espaço da feira. 

Por meio  de desenhos e imagens que mostrem o que o espaço "pode ser" (virtual), projetando não somente o que o espaço da feira "é", mas pequenas mudanças que podem agregar para a permanência, convívio e sensação de prazer ao visitá-la, como por exemplo, uma simples “amarelinha” uma brincadeira que é apenas pintada no chão que atrai não só crianças como jovens e adultos, é quase irresistível passar por ele e não fazer seu percurso; e é essa a intenção que trazemos para a ideia do que pode ser o espaço da feira. Neste ponto do trabalho, também assumimos a referência de Bernard Tschumi, ao criar uma narrativa que apresenta, de forma não cronológica, os espaços que os personagens percorrem: são os eventos nos espaços que tornam possível o espaço existir.

 

Considerações finais

A partir do desenvolvimento dos estudos da pesquisa, da produção de leituras, da elaboração dos fichamentos, do estudo de imagens e dos sistemas cartográficos predominantes (recortados ao da Google), e, por fim, da confecção do atlas que sintetiza o trabalho, alcançaram-se importantes reflexões. Percebe-se, primeiramente, a importância do olhar crítico para o sistema cartográfico hegemônico, principalmente, no que se refere ao da Google, formado por Earth, Maps e Street View. Isto porque o mapa é sempre político e sempre representa os interesses de quem o elabora, cabendo ao leitor interpretar o que está sendo apresentado no contexto de uma imagem ou de um desenho cartográfico; e, no caso da Feira do João Francisco, essa representação mascara sua existência, já que ela não faz parte do momento de captura, como evidenciado no Street View, tampouco da colaboração por pins dos usuários da feira.

Somado a isso, com o enfoque nas leituras acerca dos eventos e acontecimentos urbanos, por meio da bibliografia de Tschumi (1994) e Solfa (2010), percebe-se a necessidade de ampliação dessa visão na arquitetura e urbanismo, no que diz respeito às representações, no estudo dos eventos “atuais" e "virtuais” na cidade. Estes eventos são responsáveis por grande parte da constituição do caráter público e das práticas do convívio social dentro das sociedades. Assim, a Feira do João Francisco, como um evento temporário, assume um papel de destaque a partir deste conceito, atribuindo-se não somente valores de convívio público e de práticas de encontros urbanos, como também relações comerciais entre os habitantes da região.

Por último, porém não menos importante, talvez até o mais valioso produto, é o impacto que a imaginação possui para a arquitetura e urbanismo e para as diversas formas que podemos representá-la. Este trabalho, assim, destaca que a percepção dos espaços e de seus eventos é possível por meio da imaginação e da inventividade das formas de representação, sendo necessário que uma ou várias pessoas imaginem o que espaço físico pode vir a se tornar, como estudado a partir do conceito de “virtual” (DELEUZE, 2003). Entretanto, a imaginação sozinha não é suficiente para conceber o espaço e suas modificações, sendo necessário testar modos de representar tais acontecimentos, destacando-se, para isso a importância do estudo de diferentes linguagens de representação, como textos, desenhos, fotos, mapas, plantas arquitetônicas, etc. De tal modo que, quanto maior a abrangência de tipologias representativas, mais complexas podem ser as reflexões e mais possibilidades podem ser abertas.

​Referências bibliográficas

CERTEAU, M. A invenção do cotidiano.: 1. Artes do fazer. Petrópolis: Vozes, 2013.

CORRÊA, F. P; Lima, L. O. A centralidade da cidade de Goiás: o setor João Francisco e o papel da avenida Dário de Paiva Sampaio na estruturação do espaço urbano. In: Élisée, Rev. Geo. UEG – Anápolis, v.4, n.2, p.182-195, jul./dez. 2015.

DELEUZE, G.  O atual e o virtual. Texto originalmente publicado em anexo à nova edição de Dialogues, de Gilles Deleuze e Claire Parnet (Paris, Flammarion, 1996). Disponível em: https://antropologiassociativa.files.wordpress.com/2010/06/deleuze_1996_o-atual-e-o-virtual_bookchapt.pdf . Acesso em 20/08/2021.

MARGOTTO, M. V. M; ALMEIDA, L. P. Homo Tegumen. Urbanismo Unitário, ficção científica e crítica à produção do espaço urbano. Arquitextos, São Paulo, ano 20, n. 239.02, Vitruvius, abr. 2020 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/20.239/7678>.

RAMOS, G. Mapas-movimentos: narrativas de deslocamentos por meio de [outros] funcionamentos de sistemas cartográficos. Tese (Doutorado) – Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo, Teoria e História da Arquitetura e do Urbanismo (Orientador: David M. Sperling). Instituto de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Carlos, 2021, 234 p.

RIBEIRO, A. C. T. Sociabilidade, hoje: leitura da experiência urbana. In: Caderno CRH, Salvador, v. 18, n.45, p. 411-422, Set/Dez 2005.

SANTOS, M. Elogio da lentidão. São Paulo: Folha de São Paulo, 11 de março de 2001.

______. O retorno do território. Santos, M.; Souza, M. A.; Silveira, M. L. Território: globalização e fragmentação. São Paulo: Hucitec, 1994.

______. O tempo nas cidades. São Paulo: Ciência e cultura, 56, 2, abril-maio 2004, p.21-22;

SOLFA, M. Interlocuções entre arte e arquitetura como práticas críticas: a teoria arquitetônica de Bernard Tschumi e a cena artística dos anos 1970. Dissertação (Mestrado). Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos, 2010.

SPERLING, D. Você (não) está aqui: convergências no campo ampliado das práticas cartográficas. In: Indisciplinar / EA-UFMG. Belo Horizonte (MG), V. Semestral, n.2, v.2 (2016), pp. 77-92.

TSCHUMI, B. The Manhattan Transcripts. London: Academy Editions, 1994.

VIRILIO, P. Velocidade e Política. São Paulo, Estação da Liberdade, 1996.

______. Espaço crítico. São Paulo: Editora 34.

 

 

Nota

Aqui indica-se o link do arquivo do Atlas citado no texto como parte da pesquisa realizada durante o período da iniciação científica. O Atlas (baseado no formato escrito de jornal), trabalha a Feira observando quatro aspectos principais: “O que era”, “O que o mapa mostra”, “O que é” e “O que pode ser”. Este último foi realizado por meio de uma narrativa imagética do espaço virtual da feira, como aquilo que ela pode ser, numa linguagem baseada em Manhattan Transcripts, de Bernard Tschumi. Dessa forma, registramos a discussão colocada neste relatório para a Feira do João Francisco.


Atlas disponível aqui.

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